Uma realidade preocupante

A questão do transporte coletivo é, certamente, uma dos melhores exemplos de como decisões políticas impactam na vida e, principalmente, no dia a dia de todos nós. É ponto pacífico que as manifestações de junho do ano passado trouxeram uma agenda nacional em torno do transporte coletivo e da mobilidade urbana.

O Politiza mostra como o transporte e a mobilidade - expressões máximas do direito constitucional de ir e vir - estão intrinsecamente ligados à política. O ponto de partida, para esse amplo e importante debate, foi a Capital dos gaúchos, ainda no ano passado, quando a população foi às ruas para pedir por qualidade nos serviços prestados. Em alto e bom som o coro de vozes que bradou, aqui, nos Pampas por mudanças em pouco tempo reverberou por todo o país. E como diziam os manifestantes: não se tratavam apenas por R$ 0,20.

O geógrafo e especialista em mobilidade urbana, Yuriê Baptista César avalia que o Brasil vai na contramão de países mais desenvolvidos, onde há políticas de desestímulo ao uso de carros:

_ Onde o transporte funciona é porque ele é prioridade do governo. E no Brasil, a prioridade da União é o automóvel, maior exemplo disso é a redução do IPI (Imposto sobre Produção Industrial, que é cobrado sobre carros, e teve forte redução pela União). O Brasil é hoje o maior produtor de automóveis do mundo. Já os ônibus que circulam pelo país são de péssima qualidade.

João Fortini Albano, professor de transportes da UFRGS e especialista em mobilidade urbana, é categórico ao dizer que o Brasil ainda engatinha no quesito obras viárias - como a construção de rodovias, viadutos, túneis. Não bastasse todos esses gargalos, são praticamente inexistentes o alargamento de estradas, a criação de corredores exclusivos para ônibus e, principalmente, de políticas de estímulo ao transporte coletivo, destaca. Ele chama a atenção para outra questão: a qualidade do serviço prestado, de forma geral, pelas empresas de ônibus:

_ O transporte público não pode ser deficitário se ele (o serviço) é feito por empresas privadas. Agora, também deve-se entender que as empresas precisam também ter lucro. O lucro é algo inerente ao empreendedor e a quem desempenha uma atividade econômica. E, obviamente, toda melhoria tem um custo e que acaba sendo transferida ao preço da tarifa.

Outra questão polêmica que sempre vem à tona quando o assunto é o transporte coletivo é a planilha de custos (utilizada para dar embasamento ao preço da passagem). Antonio Escosteguy Castro, advogado e especialista em temas de transporte e mobilidade urbana, lembra que o propósito da planilha é o de assegurar critérios técnicos e matemáticos para o cálculo:

_ A planilha surgiu, ainda na década de 80 em Porto Alegre, com o propósito de trazer critérios matemáticos ao se ter um cálculo científico e técnico. Mas a tarifa perdeu a sua cientificidade até porque a planilha foi apropriada por burocratas e donos de empresas de ônibus. Hoje, há uma manipulação proposital e a planilha já não representa mais a realidade. É preciso buscar uma planilha que, de fato, expresse os custos reais das empresas de ônibus.

O subsídio, a busca pela tarifa zero e o modelo ideal para Santa Maria

Movimentos sociais e, inclusive, partidos mais à periferia da política tradicional costumam dizer que caberia ao governo subsidiar o custo da passagem, ou seja, pagar a tarifa dos usuários de ônibus. O tema é polêmico. O professor de Transportes da UFRGS, João Fortini Albano, acredita que o melhor caminho seria um sistema compartilhado. Ele explica:

_ Em outros países há uma tendência em não se aderir ao subsídio, mas, sim, em um sistema compartilhado, ou seja, o usuário paga uma parte e o Estado a outra. Outra questão que a sociedade precisa repensar são as gratuidades. Obviamente, que muitas delas (gratuidades) são justas, mas tantas outras são fruto de pura demagogia barata.

O advogado Ant